Tribunal de Mântua questiona a constitucionalidade da nova lei da cidadania italiana: o que está em jogo?
Gabriela Pimentel
11/24/20254 min ler
Nos últimos meses, o debate sobre a cidadania italiana por descendência ganhou protagonismo nos tribunais italianos. Após o Tribunal de Turim, agora foi o Tribunal de Mântua que encaminhou ao Tribunal Constitucional uma nova contestação envolvendo o artigo 3-bis da Lei nº 91/1992, introduzido pelo Decreto-Lei nº 36/2025 e convertido posteriormente na Lei nº 74/2025.
Para entender o impacto dessa decisão, veja o panorama do que este artigo aborda:
📌 O que você vai encontrar neste post
O que diz o artigo 3-bis e por que ele gerou questionamentos
Por que tribunais consideram a regra potencialmente inconstitucional
O papel do Tribunal Constitucional na definição do futuro da cidadania italiana
Conceitos jurídicos importantes, como retroatividade, expectativa legítima e art. 11 do Código Civil
O que essa decisão pode significar para descendentes de italianos no exterior
O que diz o artigo 3-bis da Lei nº 91/1992
O artigo 3-bis, incluído pela Lei nº 74/2025, introduziu um novo limite ao reconhecimento da cidadania italiana por descendência (ius sanguinis), estabelecendo que indivíduos nascidos no exterior antes da entrada em vigor da lei não teriam mais direito ao reconhecimento automático da cidadania — mesmo quando descendentes de italianos.
Essa mudança afetou principalmente:
processos administrativos em consulados,
ações judiciais em andamento,
e famílias com processos iniciados antes de 2025.
A introdução do artigo 3-bis alterou uma compreensão jurídica que vinha sendo aplicada há décadas, segundo a qual a cidadania por descendência é adquirida automaticamente no nascimento, independentemente do local de nascimento ou do número de gerações.
Por que o Tribunal de Mântua contestou o novo dispositivo
Assim como Turim, o Tribunal de Mântua considerou que a aplicação do artigo 3-bis a pessoas nascidas antes da lei gera uma perda retroativa da cidadania, algo que contraria princípios fundamentais da legislação italiana.
Segundo a análise do juiz responsável, o dispositivo pode violar:
o direito à igualdade, previsto no artigo 3 da Constituição Italiana,
e o princípio da expectativa legítima, que protege cidadãos e descendentes contra mudanças abruptas e retroativas em direitos já consolidados.
O que é "expectativa legítima"?
É um princípio jurídico que impede que uma norma prejudique quem já cumpria requisitos sob a legislação anterior. Em outras palavras: quem estava sob um regime jurídico deve poder confiar que seus direitos não serão retirados retroativamente.
Retroatividade e cidadania: um ponto central
O Tribunal de Mântua destacou que a cidadania italiana por descendência, ao ser considerada adquirida no nascimento, não pode ser retirada por uma lei posterior — especialmente sem previsão constitucional clara.
Com base nisso, o juiz defendeu que a única interpretação constitucionalmente possível é:
O artigo 3-bis só pode ser aplicado a pessoas nascidas após a entrada em vigor da lei.
Para os nascidos antes, prevalece o princípio de que as leis só produzem efeitos para o futuro.
Essa interpretação é reforçada pelo artigo 11 das Disposições Preliminares do Código Civil Italiano, que estabelece que “a lei não dispõe senão para o futuro: não tem efeito retroativo”.
O uso do decreto-lei também foi criticado
Outro ponto levantado pelo Tribunal de Mântua foi o uso do decreto-lei (Decreto-Lei nº 36/2025) para regulamentar um tema tão sensível quanto a aquisição e perda de cidadania.
O que é um decreto-lei?
É uma norma emanada pelo governo em situações de urgência, com vigência imediata, mas que precisa ser convertida pelo Parlamento em até 60 dias.
Para o juiz, temas de direitos fundamentais, como cidadania, deveriam ser tratados diretamente pelo Parlamento desde o início, com debate amplo — não por meio de medidas urgentes.
O que acontece agora: papel do Tribunal Constitucional
Com a decisão de Mântua, o processo foi suspenso e encaminhado ao Tribunal Constitucional da Itália, que terá a função de decidir se o novo artigo 3-bis:
é compatível com a Constituição,
viola ou não o princípio da igualdade,
respeita o conceito de cidadania adquirida no nascimento,
e se pode ser aplicado retroativamente.
O Tribunal Constitucional já recebeu outras questões similares, inclusive de Turim, tornando provável que as ações sejam analisadas de forma integrada.
O que é o Tribunal Constitucional?
É o órgão máximo de controle de constitucionalidade na Itália — o equivalente ao STF no Brasil.
Ele decide se uma lei viola ou não a Constituição. Sua decisão tem efeito geral e vincula todos os tribunais.
O que isso significa para os descendentes de italianos
A decisão do Tribunal Constitucional poderá:
restaurar direitos para quem nasceu antes da nova lei,
limitar o alcance do artigo 3-bis,
ou confirmar as restrições impostas.
Enquanto isso, tanto a via administrativa quanto a via judicial continuam existindo, e muitos processos vêm sendo analisados normalmente.
Conclusão
A contestação do Tribunal de Mântua reforça um movimento crescente dentro da Itália: a necessidade de reavaliar a constitucionalidade das novas regras de cidadania.
A discussão envolve temas fundamentais como:
segurança jurídica,
igualdade,
proteção à família,
e o limite da atuação legislativa do governo.
Nós acompanhamos diariamente as decisões dos tribunais italianos e suas implicações para os processos de cidadania por descendência.
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